Um grande professor de literatura fez uma indagação ao
chegar à sala de aula: há diferença entre alimentar-se e comer? Eu, como
professor da área de alimentos, lógico que disse que sim, que há uma diferença
entre “alimentar e comer”. Exemplifiquei: alimentar-se é quando você tem
realmente uma refeição, um almoço constituído de feijão, arroz, carne, salada; já
comer seria o nosso salgadinho de milho, a nossa batata frita, a nossa famosa
coxinha. Sim, eu estava correto, e o professor foi um pouco mais além e
novamente indagou: mas quando falamos de literatura, qual seria a diferença? Então
o professor começou a citar exemplos, em sua explicação chegou à conclusão de
que para se alimentar, nós nos alimentamos de Machado de Assis, de Monteiro
Lobato, de Graciliano Ramos, de José de Alencar e comer, nós comemos Paulo
Coelho, Martha Medeiros e se for realmente uma “comida do tipo lixo” do tipo fast food, comemos
um “Augusto Cury”. Muitos riram, mas eu me tranquei e fiquei absorto em meus
pensamentos, talvez o valor de alguns autores para aquele renomado professor em
literatura fosse diferente, mas mesmo assim me senti compelido com a sua comparação,
gosto de todos os autores que foi dito como "literatura lixo”. Então, ao final da aula, levantei o braço e disse: estimado professor, muitas vezes necessitamos nos alimentar, mas entre se
alimentar e comer, qual dos dois é o mais prazeroso? Qual o que causa mais impacto e que muita vezes ficam em nossas memórias, seja um cheiro, uma lembrança, o que realmente nos marca a alma? Falo-me sobre alguns
livros chatos que fui obrigado a me alimentar, assim como minha mãe fazia com a
comida que eu rejeitava e ela empurrava goela abaixo, sendo a mesma forma
repetida pelos professores do ensino médio com alguns livros obrigatórios. Nossa! Tantos livros eu tinha para ler e estava preso a uma tal de “Iracema”... Perceba onde quero chegar, alimentar-se é
preciso, mas comer, comer é muito melhor, é muito mais divertido, não que às
vezes eu não queira um prato mais rebuscado e que eu não viaje nas letras do
português Fernando Pessoa, mas muitas vezes e confesso, na grande maioria das
vezes, eu quero me divertir com o cotidiano, quero comer, chupar, lamber a gaúcha Martha
Medeiros, quero devorar Augusto Cury, com curry ou não, como se fosse um
sanduíche de fast food, quero ler Allan Percy e suas doses homeopáticas de autoajuda. Por que
não? Caro professor, saiba que eu sei muito bem que há uma diferença entre alimentar e comer, que às vezes me alimento em restaurantes caros e muitas vezes, o prato pomposo é sem sabor, sem graça, apesar de ser muito nutritivo! Mas, para um cinema eu não resisto a uma pipoca com
manteiga e quer saber? São nessas horas que me divirto muito mais!
Carpe diem
Márcio Dadox